O livro The One-Page Financial Plan (Plano Financeiro de Uma Página), de Carl Richards, lançado em 2016, trouxe uma abordagem inovadora ao planejamento financeiro, ao propor que todo o processo fosse simplificado em uma única página.
O setor tem evoluído ao longo dos anos, deixando para trás o foco na venda de produtos e informações, e se voltando cada vez mais para a oferta de conselhos personalizados. Com essa transformação, o tipo de “entregável” fornecido ao cliente no final do processo de planejamento também mudou. Muitos ainda imaginam um “plano financeiro” como um fichário grosso e encadernado, algo tradicionalmente usado para validar a venda de produtos ou demonstrar a complexidade das informações oferecidas.
Contudo, apesar da aparência robusta desses documentos, eles rapidamente se tornam desatualizados. Para os consultores que vendem conselhos em vez de produtos, essa obsolescência é um desafio, já que as mudanças nas circunstâncias e objetivos dos clientes podem invalidar o plano original. É por isso que o processo contínuo é mais relevante do que um plano fixo e estático. Como afirma Roger Whitney, outro defensor dessa visão, o planejamento financeiro real precisa ser ágil.
Além disso, a maioria dos clientes não está interessada nos detalhes técnicos, como simulações ou métricas avançadas. Eles buscam a segurança de saber que estão no caminho certo e desejam orientação sobre o que fazer a seguir.
Nesse contexto, o Plano Financeiro One Page se destaca como uma ferramenta poderosa. Ele permite que consultores e clientes se concentrem no essencial, reduzindo a complexidade e destacando a importância do planejamento contínuo, ao invés de depender de um único plano financeiro extenso e inflexível.
O que é um Plano Financeiro One Page (OPFP)?
O One-Page Financial Plan (OPFP) funciona essencialmente como um resumo de um plano financeiro mais extenso. Embora, em teoria, possa existir de forma autônoma, na prática, ele se revela mais eficaz quando utilizado em conjunto com softwares de planejamento financeiro e outras ferramentas de FinTech.
Atualmente, um dos desafios no uso de softwares é a abundância de opções. Mesmo com o objetivo de simplificar o processo, o grande número de ferramentas pode tornar a experiência excessiva em termos de volume de dados.
O One-Page Financial Plan (OPFP) visa consolidar os principais pontos de diversas ferramentas e análises de software de planejamento financeiro em uma única página. No entanto, em certas situações, pode ser útil permitir que o cliente faça login diretamente nas diferentes plataformas, seja junto com o consultor ou de forma independente, para explorar áreas específicas com mais profundidade. Ainda assim, o valor central do OPFP está em simplificar os conceitos-chave, garantindo que todas as informações relevantes estejam resumidas de forma clara e acessível em um único documento. Isso facilita tanto a compreensão quanto a implementação do plano financeiro, sem sobrecarregar o cliente com detalhes excessivos.
Exemplo de Plano Financeiro One Page da Fident Financial
O Plano Financeiro One Page (OPFP) começa com Valores Familiares ou Valores Pessoais no caso de indivíduos, porque as melhores decisões financeiras têm suas raízes nos valores do cliente. Como Bill Bachrach destacou em uma conversa recente com Kitces, os valores são fundamentais para a construção de um plano financeiro sólido. Embora o processo de descoberta desses valores exija mais tempo e reflexão, eles são menos propensos a mudar ao longo do tempo. Assim, eles servem como base estável sobre a qual todo o restante é construído, mesmo que outros elementos possam se adaptar conforme as circunstâncias mudam.
Após compreender os valores fundamentais de um cliente, o consultor passa para a próxima seção do Plano Financeiro One Page (OPFP): o fluxo de caixa. Inspirado em uma ideia da Kingdom Advisors, o consultor categoriza o fluxo de caixa em quatro áreas principais: Viver, Dar, Dever e Crescer.
A categoria Viver se refere às despesas essenciais, enquanto Dar abrange doações, tanto dedutíveis quanto não dedutíveis. O consultor incentiva os clientes a desenvolverem uma Filosofia de Generosidade pessoal. A categoria Dever inclui obrigações financeiras, como dívidas e impostos, sendo que o consultor analisa as obrigações tributárias a partir das declarações de imposto de renda. Por fim, Crescer diz respeito ao montante alocado para aumentar o patrimônio líquido, como investimentos em contas de aposentadoria e veículos de poupança.
Essa estrutura de fluxo de caixa pode ser utilizada tanto para planejamento futuro quanto para análise de dados passados. Quando voltada para o futuro, o consultor foca em resumos de alto nível, evitando detalhes desnecessários. Se for retrospectiva, utiliza documentos como declarações de investimento e de imposto de renda para calcular as categorias Dar, Dever e Crescer.
A colocação do fluxo de caixa logo abaixo dos Valores permite identificar eventuais desconexões entre o que o cliente valoriza e como realmente aloca sua renda.
Em seguida, o consultor aborda as Metas, uma seção que requer certa criatividade devido ao espaço limitado. O objetivo é ajudar o cliente a identificar quais metas são prioritárias, resumindo aquelas de curto a médio prazo e monitorando o status de cada uma. Isso proporciona um senso de responsabilidade e mantém o foco nas ações que devem ser tomadas.
Logo abaixo das Metas, o consultor apresenta uma Alocação de Ativos em forma de gráfico, ilustrando como os investimentos estão posicionados de acordo com as metas estabelecidas. Isso é especialmente útil em momentos de volatilidade de mercado, conectando decisões de portfólio às metas originais.
Na parte superior da coluna da direita, um gráfico de Patrimônio Líquido Histórico é incluído. Para novos clientes, isso pode ser uma tabela simples de ativos e passivos, mas, com o tempo, o consultor pode apresentar uma visualização do patrimônio líquido ao longo dos anos, mostrando um progresso positivo.
Em seguida, um gráfico de Localização de Ativos é apresentado, demonstrando onde estão os passivos fiscais em relação aos investimentos, diferenciando entre contas com imposto diferido e contas isentas de impostos.
Por fim, na parte inferior direita, são listados os Itens de Ação Pendentes, divididos em ações imediatas e futuras. Isso permite que o cliente veja o que precisa ser realizado a curto prazo, assim como questões reconhecidas que ainda não estão sendo trabalhadas.
Embora o ideal seja condensar tudo em uma única página, em alguns casos, o consultor pode anexar informações suplementares, como instruções específicas para realocação de investimentos ou estratégias de planejamento patrimonial.
Benefícios de usar um Plano Financeiro One Page
Existem várias razões pelas quais ele é vantajoso para consultores e seus clientes, mas a mais convincente é que muitos clientes, na verdade, raramente se dedicam a revisar o documento extenso que tradicionalmente é enviado. Durante as reuniões de apresentação, é comum observar que os olhos dos clientes começam a se perder na quantidade excessiva de dados apresentados. Uma vez que o fichário deixa o escritório, é provável que os clientes nunca o abram novamente; em algumas ocasiões, eles até “esquecem” de levá-lo.
O OPFP aborda essa realidade ao separar o plano financeiro em elementos que realmente importam para os clientes. Ele se concentra nas informações que eles conseguem absorver e entender durante a reunião, garantindo que os pontos essenciais sejam destacados e discutidos. Essa abordagem simplificada facilita a compreensão, mas também aumenta a probabilidade de que os clientes se sintam mais engajados e motivados a seguir as recomendações apresentadas.
Os clientes realmente pagarão por apenas uma página?
Essa dúvida assombra vários consultores, pois, após o cliente investir muito dinheiro em um plano financeiro, entregar um único documento parece, à primeira vista, insatisfatório. No entanto, essa insegurança revela uma crença equivocada de que o valor de seu trabalho está atrelado à quantidade de informações fornecidas.
Muitos compartilham dessa mesma sensação, acreditando que precisam oferecer evidências mais “concretas” para justificar suas taxas. Contudo, ao se empenharem em simplificar informações complexas, estão, na verdade, entregando um valor muito maior do que o cobrado. Se os clientes quisessem apenas dados volumosos, poderiam facilmente buscar informações na internet. Eles procuram um consultor pela habilidade de condensar essas informações nas conclusões essenciais que precisam para avançar.
O OPFP visa concentrar os clientes no que mais importa
Uma segunda razão pela qual mais consultores deveriam adotar o Plano Financeiro One Page (OPFP) é a sua capacidade de ajudar tanto os clientes quanto os consultores a focar nas prioridades corretas. Por ser curto e simples, ele permite uma distinção clara entre o que é Ruído e o que é Sinal em meio à quantidade diária de informações.
Carl Richards oferece um esboço valioso que ilustra o que é realmente importante e o que está sob nosso controle. O OPFP facilita essa diferenciação, permitindo que os consultores e seus clientes se concentrem no que realmente importa para alcançar seus objetivos financeiros.
Além disso, o OPFP demonstra que o verdadeiro valor do planejamento financeiro vai além da criação de um documento único. Uma consequência do plano financeiro tradicional ser extenso e demorado é que muitas empresas o atualizam apenas a cada vários anos. Em contraste, por ser mais curto e fácil de produzir, pode ser atualizado regularmente, seja anualmente ou em cada reunião de acompanhamento com o cliente.
Como Carl Richards observa, “nós, planejadores financeiros, não queremos ser defensores de um mapa desatualizado; queremos ser guias em um cenário em constante mudança”. O OPFP, ao ser frequentemente atualizado, comunica aos clientes que o plano é dinâmico. O verdadeiro valor dos consultores está em manter os clientes informados sobre sua situação atual e orientar os próximos passos necessários para manter seu progresso.
A pandemia de COVID-19 é um exemplo claro de como planos financeiros podem ser drasticamente alterados. Estimativas que antes pareciam sólidas, baseadas em suposições sobre renda e retornos de ativos, foram rapidamente superadas. Embora este tenha sido um exemplo extremo, a única certeza sobre o futuro é sua incerteza.
O que tende a ser mais estável, pelo menos no curto prazo, são os valores e objetivos dos clientes. Um documento que os recorda e torne esses princípios firmes é extremamente valioso.
O Plano Financeiro completo como suporte técnico
Haverá momentos em que os clientes terão perguntas mais específicas ou desejarão informações mais detalhadas sobre seu plano do que aquelas apresentadas de forma resumida. Nesses casos, os consultores podem imprimir relatórios do software de planejamento financeiro ou, ainda melhor, ensinar os clientes a navegar por esses sistemas. Embora um software completo seja essencial para desenvolver as recomendações corretas, o OPFP serve como uma alternativa de entrega, sem substituir a análise necessária.
O ponto principal é reconhecer que o resumo não exclui a análise rigorosa realizada por meio do software tradicional. Existem momentos em que a saída do software é necessária para complementar o resumo – seja como um “suporte técnico” para validar os números, ou para aprofundar detalhes, caso o cliente tenha mais perguntas. No entanto, na prática, quando o resumo fornece as informações que os clientes realmente desejam e precisam, a demanda por detalhes adicionais tende a ser muito menor do que o esperado.
Como construir, implementar e manter um Plano Financeiro One Page
Os planos financeiros detalhados geralmente são feitos em software específico, mas um OPFP é criado e mantido fora dessas plataformas. O consultor pode usar ferramentas do Google, como Docs e Planilhas, mas é possível fazer o mesmo no Microsoft Office.
No Google Docs, o plano é montado e atualizado, enquanto a Planilha coleta dados de outras fontes, como RightCapital e Holistiplan, para gerar gráficos que aparecem no documento principal. A ideia é usar menos texto e mais imagens, já que elas comunicam informações complexas de forma mais clara.
Para cada cliente, o autor cria um modelo nos dois programas, que são salvos em pastas específicas e atualizados ao longo do relacionamento. Essa abordagem permite aos consultores ter liberdade em relação às ferramentas que usam, escolhendo provedores e integrando as informações como preferirem.
Além disso, usar documentos independentes dá controle total sobre a aparência do plano e quais informações são incluídas, garantindo que ele atenda às necessidades de cada cliente.
Mantenha o OPFP como um documento de ‘Plano de Vida’
Uma vez que o OPFP é criado, ele se torna um documento dinâmico. A primeira versão é montada após a reunião inicial com o cliente, servindo como base para o trabalho futuro. À medida que as metas se tornam mais claras, elas são atualizadas e priorizadas. A declaração de patrimônio líquido é construída e ajustada, e a situação tributária é quantificada conforme se avança. As tarefas são registradas e as novas são adicionadas à medida que as anteriores são concluídas.
Integre e automatize atualizações para o OPFP
Após o planejamento inicial, o consultor comunica que o documento continuará a mudar naturalmente. Ele salva versões anteriores em PDF, datando cada uma, para mostrar o progresso ao longo do tempo. Durante as reuniões de acompanhamento, o OPFP é geralmente o único documento utilizado, funcionando como um guia para a conversa. Como é uma síntese de dados de outras ferramentas, é importante mantê-lo atualizado. Isso significa que, sempre que as circunstâncias mudam, o OPFP também deve ser revisado. O consultor usa planilhas para extrair dados das ferramentas que utiliza, atualizando automaticamente os gráficos no documento.
Se houver uma nova declaração de impostos, o consultor verifica os dados mais recentes para ajustar a taxa de imposto efetiva e faz as alterações necessárias no OPFP. Após atualizar os gráficos, ele revisa as metas e itens de ação para garantir que tudo esteja alinhado.
Sabe quanto tempo leva para atualizar o plano? 2 minutos e 37 segundos. Embora o tempo total de preparação para uma reunião possa ser maior dependendo dos tópicos abordados, a atualização é bastante rápida, uma vez que o modelo está estabelecido.
A transição para um Plano Financeiro One Page representa uma mudança significativa na forma como abordamos o planejamento financeiro. Ao simplificar a complexidade e focar nas prioridades dos clientes, essa abordagem não apenas facilita a compreensão, mas também promove um diálogo mais produtivo entre consultores e clientes. Com um formato mais acessível, os consultores podem atualizar e ajustar os planos com frequência, garantindo que permaneçam relevantes e alinhados com as metas dos clientes. A implementação do OPFP pode transformar a experiência, permitindo que os consultores ofereçam um valor real e contínuo. Ao considerar essa prática em suas próprias empresas, os consultores atenderão às expectativas de seus clientes, mas também fortalecerão suas relações de longo prazo, promovendo um planejamento financeiro mais eficaz e adaptável a um mundo em constante mudança.
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